HIPERSENSIBILIDADE ALIMENTAR EM CÃES – ESTUDO DE 3 CASOS CLÍNICOS Alimentary Hypersensitivity in Dogs - Study of 3 Clinical Cases
A hipersensibilidade alimentar é uma das condições que mais estressam
animais, proprietários e médicos veterinários, sendo desencadeada por um tipo
de reação adversa de natureza imunológica, levando a desordem cutânea
pruriginosa e não sazonal. O diagnóstico definitivo é dado pela realização de uma
dieta de eliminação e, uma vez confirmado o diagnóstico, o paciente deve receber
ração de eliminação comercial ou dieta caseira, obtendo-se um bom prognóstico.
Este trabalho descreve os procedimentos realizados até o diagnóstico e o
tratamento de 3 cães, de diferentes raças e sexo, com idade entre 8 meses e 1,6
anos, apresentando hipersensibilidade alimentar, que após o diagnóstico e a
instituição de ração hipoalergênica, demonstraram melhora significativa no quadro
Palavras-chave: Hipersensibilidade alimentar, desordem cutânea, dieta
The alimentary hypersensitivity is one of the conditions that put animals,
proprietarys and veterinarys under stress, occuring do to a type of adverse
reaction with immunologic nature, that causes a pruritus cutaneous disorder and
no seasonal. The definitive diagnosis is presented by the realization of an
elimination diet and, when diagnosis is confirmed, the patient has to receive
comercial elimination ration or home-made diet, obtaining a good prognostic. This
work describes the realized procedures until the diagnosis and the treatment of 3
dogs, with different race and sex, age between 8 months and 1,6 years,
presenting alimentary hypersensitivity, that after the diagnosis and the institution of
hypoal ergenic diet, demonstrated significant improvement on the clinical
Keywords: Alimentary hypersensitivity, cutaneous disorder, diet
A hipersensibilidade alimentar (HA) é um tipo de reação adversa de
natureza imunológica que acomete cães e gatos, levando a desordem cutânea
pruriginosa e não sazonal, associada presumivelmente ao material antigênico
presente na dieta, e quase exclusivamente causada por proteínas e peptídeos,
que escapam à digestão e são absorvidos intactos através da mucosa
De acordo com Loeffler et al. (2004), existem dois tipos de reação adversa
ao alimento, uma reação imunomediada de alergia ao alimento e uma reação não
imunológica de intolerância ao alimento. Ackerman (1998) e Hal iwel (2007)
concordam que as reações adversas aos alimentos podem ter uma base
imunológica ou podem se desenvolver sem o envolvimento do sistema imune
(intolerância alimentar), tendo esta última, vários tipos diferentes de reação, como
reações de toxicidade, reações de idiossincrasia, reações farmacológicas e
metabólicas. Em muitos casos, a intolerância e a hipersensibilidade podem
A reação imunológica presente na alergia alimentar é similar àquela
promovida pela defesa do organismo contra agentes infecciosos ou outros que lhe
possam causar danos (NASCENTE et al., 2006). Em cães a pele é um importante
alvo para as reações adversas ao alimento, mas sinais gastrintestinais e, menos
freqüentemente, problemas respiratórios e neurológicos também ocorrem
A HA é uma das condições que mais estressam animais, proprietários e
médicos veterinários. Estima-se que 15% da população canina sofra de alergia,
contexto no qual a HA ocupa o terceiro lugar de incidência, antecedida pelas
alergias inalatórias (atopia) e pelas picadas de pulga (DAPP). Alguns estudiosos
acreditam que a HA pode ser a causa de 1% de todas as dermatoses observadas
na clínica de pequenos animais, enquanto que outros investigadores postulam
que essa enfermidade represente entre 23 e 62% de todas as dermatoses
alérgicas não sazonais (NASCENTE et al., 2006).
Ainda não se esboçaram os mecanismos exatos da HA nos cães e gatos
(WHITE, 2003). Conforme Wil emse (1995) e Duclos (2005), uma alergia
alimentar é uma manifestação de hipersensibilidade do tipo I, III, ou IV a um ou
mais componentes da dieta, como carboidratos, preservantes, corantes,
aromatizantes e proteínas. De acordo com Mul er et al. (1985), embora o
mecanismo patológico da HA seja obscuro, as reações de hipersensibilidade do
tipo I são bem documentadas no homem, havendo suspeitas quanto às reações
dos tipos III e IV. As reações “imediatas” e “retardadas” a alimentos foram
Segundo White (2003), a reação imediata, ou seja, hipersensibilidade do
tipo I, ocorre de minutos a horas após a ingestão, enquanto que a reação
retardada, ou hipersensibilidade tipo IV, ocorre dentro de horas a dias após a
Todos os alimentos podem ser potencialmente alergizantes, apesar de, na
prática, serem as proteínas as causadoras mais freqüentes. Em virtude dos
hábitos alimentares, as substâncias alergizantes variam. É essencial diferenciar
os trofalérgenos dos ingredientes responsáveis pelas reações não imunológicas
(lactose, responsável por sintomas de deficiência de lactase), alimentos ricos em
histamina ou liberadores desta (alguns peixes, crustáceos, embutidos, chocolate,
etc.). Os trofalérgenos são os alérgenos alimentares, onde dentre os principais
estão a soja, leite de vaca, ovo, peixes, cereais como o trigo e a cevada, glúten,
frutas e legumes, aditivos e corantes. Em geral, os trofalérgenos são proteínas de
peso molecular variando de 10.000 e 60.000 dáltons, que não são desnaturadas
após o tratamento pelo calor, um ácido ou proteases (GUAGUÈRE e
BENSIGNOR, 2005). White (1998) complementa que os alérgenos mais comuns
nos cães são: proteína bovina e de frango, o leite, o ovo, o milho, o trigo e a soja.
Mais comumente, o alérgeno é uma glicoproteína presente no alimento e
esta pode se tornar identificável apenas após a digestão ou o calor e preparo do
alimento. É desconhecido se ocorre a sensibilização na mucosa intestinal ou ao
alérgeno absorvido. A apresentação inicial do antígeno à mucosa intestinal resulta
em resposta imune predominantemente local a IgA, que reduz a quantidade de
material antigênico absorvido através da mucosa. Há também um mecanismo de
salvaguarda pelo qual o material antigênico absorvido seja depurado via formação
de complexos imunes contendo IgA. De acordo com essas defesas, uma resposta
imunológica a uma variedade de antígenos alimentares freqüentemente ocorre
tanto em indivíduos normais como naqueles com hipersensibilidade alimentar
Segundo Duclos (2005), especula-se que, em animais jovens, infecções ou
parasitas intestinais possam causar dano à mucosa intestinal, resultando em
absorção anormal de alérgenos e subseqüentemente sensibilização.
De acordo com Lucas (2007), na HA há o envolvimento de IgE e IgA, e as
reações imunológicas do tipo III e IV, que classicamente não tem envolvimento de
Conforme Wil emse (1995), em cães a alergia alimentar é comumente
notada antes dos 6 meses de idade. Porém, Medleau e Hnilica (2003) citam que
pode ocorrer em qualquer idade. Nenhuma predileção por idade ou por sexo foi
comprovada na HA canina. A maioria dos pesquisadores não encontrou também
uma predileção racial, porém alguns pesquisadores, todavia, encontraram que o
Cocker e o Springer Spaniels, os Retrievers Labrador, Col ies, Schnauzer
miniatura, Shar Pei, West Highland White Terriers, Boxers, Dachshunds,
Dálmatas, Lhasa Apsos, Pastores Alemães e Golden Retrievers estavam sob o
risco aumentado (SCOTT et al., 1996; ACKERMAN, 1998).
De acordo com Mul er et al. (1985), não há um grupo de sinais
patognomônicos para a HA no cão ou gato. Podem ser observadas diversas
lesões cutâneas primárias e secundárias nessa patologia, como pápulas,
pústulas, urticária, eritema, escoriações, escamas e crostas. Porém, a queixa
principal é o prurido, este é não-sazonal e pouco reativo aos glicocorticóides.
Qualquer cão com prurido não-sazonal, particularmente se forem afetados
face, pés ou orelhas, ou ainda piodermatite recorrente pode apresentar
possivelmente uma reação alimentar adversa subjacente (ROUDEBUSH, 1995;
MUELLER, 2003). Conforme Medleau e Hnilica (2003), o prurido pode ser
localizado ou generalizado e, normalmente, atinge orelhas, membros, região
inguinal ou axilar, face, pescoço e períneo. Wil emse (1995) cita que em cães,
comumente há lesões papulares no abdômen e nas axilas, ou uma foliculite
pustular pruriginosa com ou sem a presença de colaretes epidérmicos. Além
disso, um eritema intenso, urticária, seborréia ou otite externa poderá ocorrer,
como manifestação singular de uma alergia alimentar.
Ocasionalmente sinais gastrintestinais, como diarréia e flatulência, podem
ser observados, e também sinais respiratórios, como a rinite, espirros e asma
O padrão da distribuição anatômica das lesões, também assume grande
importância no raciocínio clínico, para o encaminhamento do diagnóstico. Porém,
este importante parâmetro não pode ser utilizado quando se abordam os casos de
DAPP, HA e atopia (LUCAS, 2007). O diagnóstico definitivo passa pela realização
de uma prova de privação do alérgeno, utilizando um regime à base de proteínas
“puras” (preparadas ou industriais), seja um regime hipo ou analogênico a base
de hidrolisados de proteínas, seguido de provas de desafio (BROWN et al, 1995;
Antes de colocar em prática o regime de privação, é necessário assegurar-
se da cooperação do proprietário. A duração e as finalidades dessa etapa
diagnóstica e a necessidade de implicar toda a família devem ser compreendidas
antes de se iniciar o regime. É igualmente necessário controlar uma eventual
infecção digestiva, com a ajuda de um tratamento adaptado (GUAGUÈRE e
BENSIGNOR, 2005). A dieta escolhida precisa ser oferecida exclusivamente. A
profilaxia de vermes cardíacos ou suplementos intercorrentes não devem conter
extratos flavorizantes alimentares (MUELLER, 2003).
O princípio do regime de privação consiste em subtrair, do animal suspeito,
os trofalérgenos potencialmente responsáveis pelos transtornos cutâneos. Com
isso, se obtém progressivamente, um desaparecimento dos sintomas. Em um
segundo tempo os alimentos são reintroduzidos, seja um após o outro, seja
globalmente (reação in toto), para confirmar ou invalidar seu papel (GUAGUÈRE
e BENSIGNOR, 2005). De acordo com Scott et al. (1996) e Muel er (2003), uma
dieta de eliminação para cães consiste de uma fonte protéica e uma fonte de
carboidratos anteriormente não oferecida. Isso significa que a dieta de eliminação
para um paciente particular é determinada pela dieta oferecida até então a esse
animal. Gatos devem ser alimentados somente com uma fonte protéica, sem a
fonte de carboidratos, para aumentar a adesão.
As opções possíveis de fontes protéicas são carne de galinha, peru, pato,
veado, carne ovina, bovina, eqüina, bubalina, de coelho, de lebre, de canguru, de
emu, vários tipos de carne de peixe, entre outros. As fontes de carboidratos
podem consistir de arroz, batata, batata-doce, feijão ou outros (MUELLER, 2003).
Brown et al. (1995) complementam que se deve optar por uma única fonte de
proteínas e de carboidratos. O paciente deve ser alimentado com uma dieta de
eliminação controlada por 4 a 12 semanas (ROUDEBUSH, 1995). Segundo
Muel er (2003), pode-se passar 6 a 8 semanas antes de uma resposta ficar
evidente. Após uma melhora inicial, um desafio com a dieta oferecida
anteriormente se torna essencial, pois a melhora pode resultar de outros fatores,
como alterações sazonais ou ambientais ou medicação intercorrente. Se ocorrer
recidiva dentro de 2 semanas e os sinais clínicos se resolverem novamente após
a reintrodução da dieta de eliminação, o diagnóstico será confirmado.
A duração mínima da instalação do regime de privação é de 6 a 8 semanas
antes de avaliar um eventual efeito do regime. O tratamento é simples, pois
consiste na privação definitiva do alimento incriminado. No entanto, no cão as
sensibilizações parecem acentuar-se e diversificar-se com o tempo (GUAGUÈRE
e BENSIGNOR, 2005). Scott et al. (1996), afirmam que raramente os animais
desenvolvem mais hipersensibilidades dietéticas, mas necessitam de reavaliação
por dietas de eliminação e pesquisa de teste com alimentos. Essas dietas
geralmente não são adequadamente balanceadas e, nos cães jovens em
crescimento não devem ser administradas sem suplementos, tendo em vista que
o conteúdo de cálcio é particularmente baixo, uma fonte de cálcio não alimentar,
bem como vitaminas e ácidos graxos essenciais, no mínimo, devem ser
Segundo Guaguère e Bensignor (2005), os exames alergológicos não
apresentam interesse para o diagnóstico das reações cutâneas induzidas pela
alimentação no cão e no gato. Medleau e Hnilica (2003) e White (2003)
complementam que os resultados destes testes não são confiáveis. De acordo
com White (2003), isso é possivelmente devido a alterações na composição do
alérgeno com a digestão ou a uma diluição inapropriada do alérgeno-teste.
Os testes rotineiros de laboratório também não são úteis no diagnóstico de
HA canina, pois a eosinofilia hematológica ou tecidual é rara no cão (SCOTT et
A histopatologia da pele pode apresentar graus variáveis de dermatite
perivascular superficial, podendo haver predomínio de células mononucleares ou
neutrófilos, porém este exame não possui um valor diagnóstico considerável
(MEDLEAU e HNILICA, 2003; WHITE, 2003).
A fase de provocação só deve ser realizada se os sintomas tiverem
claramente regredido após a fase de privação. A realização dessa fase de
provocação é indispensável ao diagnóstico, pois mais de 50% dos animais que
melhoram por um regime de privação não apresentam recaídas quando das
reintroduções; esses animais não são alérgicos alimentares, é inútil alimentá-los
pelo resto da vida com alimentos onerosos. Por outro lado, trata-se,
freqüentemente, de indivíduos atópicos que correm o risco de recair alguns
meses mais tarde, e o diagnóstico não foi realizado (GUAGUÈRE e BENSIGNOR,
Quando se observa uma melhora, idealmente o animal deve ser desafiado
com sua dieta original para comprovar o diagnóstico. Geralmente se observará
uma recidiva na afecção dentro de 72 horas, mas isso pode levar tanto quanto 2
semanas. Deve-se acrescentar ingredientes alimentares individuais à dieta
restringida em intervalos de 5 a 10 dias, até se atingir uma dieta balanceada ou se
descobrir os alérgenos ofensores (WHITE, 2003).
A identificação do alérgeno ofensor permite uma dieta mais variada e
obtida por meio de um novo desafio seqüencial com fontes protéicas oferecidas
anteriormente. Carne bovina, de cordeiro, de galinha ou queijo e laticínios devem
ser adicionados à dieta de eliminação um a cada vez, por duas semanas, a fonte
protéica deverá ser interrompida até que a condição do paciente se estabilize.
Muitos pacientes exibem sintomas dentro dos dois primeiro dias. Essa fonte
protéica deverá ser evitada no futuro. Depois de duas semanas de determinada
fonte protéica sem sintomas clínicos, descarta-se a reação a esta proteína e ela
poderá ser oferecida no futuro (MUELLER, 2003).
O diagnóstico diferencial da HA consiste em atopia, reação a drogas,
hipersensibilidade à picada de pulgas, pediculose, hipersensibilidade parasitária
intestinal, escabiose, dermatite por Malassezia, doença seborréica de pele e
foliculite bacteriana (SCOTT et al., 1996; MEDLEAU e HNILICA, 2003; DUCLOS,
O diagnóstico diferencial entre as dermatites alérgicas deve ser feito com
base em “algumas regras” como primeiramente eliminar as infecções presentes,
tratando as piodermites, nunca tentar diagnosticar HA ou atopia na presença de
parasitas (LLOYD, 2006; LUCAS, 2007). Lucas (2007) acrescenta que não deve-
se utilizar corticosteróides durante a eliminação do parasita (DAPP) e durante a
dieta de eliminação, pois não será possível elucidar se a melhora do quadro foi
conseqüência da medicação ou da eliminação do fator que se está investigando.
Caso o quadro seja extremamente agressivo, deve-se optar pelo uso de
prednisona, por via oral, na menor dose e, exclusivamente nos primeiros 7 dias de
eliminação das pulgas, ou da dieta. Nunca esquecer que o animal pode
apresentar mais que uma dermatite alérgica associada.
Segundo Duclos (2005), medicamentos anti-pruríticos sistêmicos podem
ser úteis, durante as primeiras 2 a 3 semanas de prova de dieta, para controlar a
Quando as dietas hipoalergênicas não estiverem disponíveis, os
glicocorticóides sistêmicos e os anti-histamínicos podem ser usados para suprimir
os sinais clínicos, porém pode ser difícil de controlar com estas drogas, pois uma
resposta completa aos glicocorticóides sistêmicos é verificada somente em 50%
dos cães com HA (ROUDEBUSH, 1995; SCOTT et al., 1996).
Deve-se tratar a piodermite secundária, otite externa e dermatite por
Malassezia com medicamentos apropriados, pois o controle da infecção
secundária é um componente essencial no manejo de cães alérgicos a alimentos,
assim como estabelecer um programa de controle de pulgas (MEDLEAU e
Depois de confirmar um diagnóstico de reação alimentar adversa, o cliente
tem duas opções, onde na primeira pode continuar com a ração de eliminação
comercial para sempre, e a segunda manter uma dieta caseira, que deverá ser
apropriadamente balanceada (ACKERMAN, 1998; MUELLER, 2003).
Uma variedade de dietas protéicas limitadas e diferentes está hoje sendo
preparada por diversas empresas, e são muito atraentes porque são convenientes
e nutricionalmente completas (SCOTT et al., 1996).
Se o animal não conseguir tolerar uma ração comercial, pode-se usar uma
dieta preparada em casa, que consista de uma fonte de proteínas e carboidratos
suplementada com vitaminas e minerais, sem aditivos (WHITE, 2003).
O prognóstico é bom, porém em cães de difícil controle deve-se excluir a
possibilidade de hipersensibilidade a um ingrediente da dieta hipoalergênica,
infecções secundárias, escabiose, demodicose, atopia, DAPP e dermatite de
contato (MEDLEAU e HNILICA, 2003). Ackerman (1998) complementa que de
qualquer forma, outras alergias alimentares podem se desenvolver mais tarde e
todo o processo diagnóstico pode ter que ser repetido.
Com o objetivo de analisar a ocorrência da HA na rotina clínica, foram
selecionados três casos clínicos com este diagnóstico confirmado. A ficha clínica
dos cães foi analisada quanto à resenha, anamnese, exame clínico, exames
complementares e terapêutica realizada.
Dos três cães atendidos com diagnóstico confirmado de HA um era da raça
Cocker Spaniel, fêmea de 6 meses de idade; outro era um Golden Retriever
macho com 1 ano e 6 meses de idade e o terceiro era um Lhasa Apso fêmea de
10 meses de idade. Nos três animais a anamnese indicou a presença de doença
intensamente pruriginosa não sazonal que havia iniciado há aproximadamente 4
meses. Estes achados concordam com Wil emse (1995) que afirma que a alergia
alimentar é comumente notada em animais jovens. Segundo o autor nenhuma
predileção por idade ou por sexo foi comprovada, mas segundo Scott et al. (1996)
e Ackerman (1998) as raças Cocker, Golden Retrievers e Lhasa Apsos são
citadas como risco aumentado. Não foram relatados nestes animais sinais
respiratórios ou associados ao trato gastrintestinal que, segundo Ackerman (1998)
Os três cães avaliados neste estudo já haviam recebido tratamento a base
de xampus, antibióticos, corticosteróides e anti-fúngicos com melhora parcial. Em
um paciente a terapia acaricida também havia sido instituída sem melhora clínica.
Ao exame clínico a apresentação clínica das lesões era variada, mas os
locais de predileção observados foram cabeça, envolvendo a região periocular e
as orelhas; região axilar e face externa dos membros pélvicos. Um paciente
apresentava otite externa e lesões nos interdígitos (Golden) e em outro observou-
se seborréia seca e áreas de descamação, principalmente na região cervical
(Lhasa). De acordo com Mul er et al. (1985), não há um grupo de sinais
patognomônicos para a HA no cão ou gato, mas Roudebush (1995) cita a face,
pés ou orelhas. Medleau e Hnilica (2003) acrescentam os membros, a região
inguinal ou axilar, o pescoço e o períneo.
Todos os animais tiveram amostras de pêlo e pele coletadas para exames
parasitológico de pele e exame micológico. Em um paciente (Golden Retrivier)
identificou-se a presença de Malassezia pachydermatis, para qual foi instituída
terapia específica com itraconazole. Mesmo após o tratamento não houve
resolução do quadro pruriginoso. Scott et al. (1996); Medleau e Hnilica (2003) e
Duclos (2005) afirmam que o diagnóstico diferencial da HA deve incluir a
dermatite por Malassezia, o que foi feito neste caso.
O tratamento inicial baseou-se na exclusão de ectoparasitos como ácaros
do gênero Sarcoptes sp., pulgas e carrapatos. Portanto, os dois animais que não
haviam recebido tratamento acaricida, receberam-no mesmo com o exame
parasitológico de pele negativo. Posteriormente, como tratamento anti-pulgas
preconizou-se o uso de produtos adulticidas com ação repelente em intervalos de
15 dias. O tratamento tópico associado foi baseado no uso de xampus anti-
seborréicos, anti-sépticos e hidratantes conforme a avaliação clínica da pele e
pelagem. Scott et al. (1996); Medleau e Hnilica (2003) e Duclos (2005) afirmam
que o diagnóstico diferencial da HA também deve excluir a DAPP, a escabiose e
Por fim, em dois animais utilizou-se anti-histamínicos (clemastina) por 7
dias, além de ácidos graxos essenciais à base de ômega 3 e 6 por períodos de 60
dias. O canino da raça Golden Retriever estava recebendo prednisona e foi
indicada sua redução e suspensão. Lucas (2007) afirma que não se deve utilizar
corticosteróides durante a eliminação do parasita (DAPP), bem como durante a
dieta de eliminação, pois não será possível elucidar se a melhora do quadro foi
conseqüência da medicação ou da eliminação do fator que se está investigando.
Caso o quadro seja extremamente agressivo, deve-se optar pelo uso de
prednisona, por via oral, na menor dose e, exclusivamente nos primeiros 7 dias de
eliminação das pulgas, ou da dieta.
Os animais foram avaliados quinzenalmente, registrando-se sua evolução
conforme os tratamentos eram realizados. Frente a persistência do prurido nos
animais após 4 aplicações de anti-pulgas, indicou-se a dieta de eliminação, que
segundo Guaguère e Besignor (2005) estabelece o diagnóstico definitivo da HA.
Foi indicado realizar a dieta de eliminação com ração comercial ou caseira por 6 a
8 semanas e continuar com os banhos semanais e com controle anti-pulgas.
Guaguère e Besignor (2005) complementam que a prova de privação do alérgeno
utiliza um regime à base de proteínas “puras” (preparadas ou industriais), seja um
regime hipo ou analogênico a base de hidrolisados de proteínas, seguido de
Em todos os animais a redução do prurido foi evidenciada a partir da 5ª
semana de tratamento com a dieta de eliminação, que foi realizada com ração
comercial em dois animais e em um com dieta caseira a base de proteína ovina.
Já, após as 8 semanas da dieta de eliminação, os pacientes apresentaram
melhora significativa no quadro clínico. Segundo Muel er (2003), pode-se passar 6
a 8 semanas antes de uma resposta ficar evidente, o que foi observado no
presente estudo. Loeffler et al. (2004) realizaram um estudo com 43 cães que
apresentavam prurido não sazonal generalizado, no qual foi administrada uma
dieta comercial à base de proteína de frango hidrolizada. Em 65,2% destes cães a
intensidade do prurido reduziu durante o teste de triagem (6 semanas), mas a HA
foi diagnosticada em somente em 19,6% dos animais.
Foi indicado então o teste de provocação, ao qual todos animais foram
positivos, com prurido reiniciando na primeira semana. A terapêutica proposta foi
de mantê-los com a ração hipoalergênica e começar a reintrodução de alimentos
selecionados a cada 10 dias, observando a presença de piora no quadro. Em
caso de piora, foi indicado que se suspendesse o alimento reintroduzido. Muel er
(2003) e White (2003) complementam que após uma melhora inicial, um novo
desafio com a dieta oferecida anteriormente torna-se essencial, pois a melhora
pode resultar de outros fatores, como alterações sazonais ou ambientais ou
medicação intercorrente. Se ocorrer recidiva dentro de 2 semanas e os sinais
clínicos se resolverem novamente após a reintrodução da dieta de eliminação, o
Depois de confirmar um diagnóstico de reação alimentar adversa, o cliente
tem duas opções, onde na primeira pode continuar com a ração de eliminação
comercial para sempre, e a segunda manter uma dieta caseira, que deverá ser
apropriadamente balanceada (ACKERMAN, 1998; MUELLER, 2003), opções que
Neste presente estudo, não foram solicitados testes hematológicos,
sorológicos ou histopatológicos. Segundo Scott et al. (1996), os testes
hematológicos não são úteis no diagnóstico de HA canina, pois a eosinofilia
hematológica ou tecidual é rara no cão. White (2003) complementa que os testes
sorológicos como o TRAS ou o ELISA demonstraram não terem valor em
pequenos animais. Por fim, Medleau e Hnilica (2003) afirmam que a
histopatologia não possui um valor diagnóstico considerável.
No presente estudo, os três animais continuam recebendo a dieta
específica. Em um animal houve uma piora do quadro clínico com retorno do
prurido após 3 meses de terapia devido a uma piodermite, que foi tratada com
cefalexina. Já em outro cão, houve também recidiva do quadro após 4 meses de
tratamento; neste cão foi necessário o uso de corticoideterapia a base de
prednisona. Lucas (2007) afirma que nunca se deve esquecer que o animal pode
apresentar mais que uma dermatite alérgica associada e Ackerman (1998)
complementa que de qualquer forma, outras alergias alimentares podem se
desenvolver mais tarde e todo o processo diagnóstico pode ter que ser repetido.
No estudo de Loeffler et al. (2004) com 43 cães que apresentavam prurido não
sazonal generalizado, observou-se associação de HA e atopia em 19,6% dos
Segundo Medleau e Hnilica (2003), o prognóstico é bom, porém em cães
de difícil controle deve-se excluir a possibilidade de hipersensibilidade a um
ingrediente da dieta hipoalergênica, infecções secundárias, escabiose,
demodicose, atopia, DAPP e dermatite de contato.
A HA é uma realidade na rotina clínica de pequenos animais e o médico
veterinário deve adicionar a sua lista de diagnóstico diferencial a HA em qualquer
cão com prurido. Para tanto, outras dermatopatias devem ser excluídas, como a
escabiose, a DAPP e a atopia, lembrando que a dermatite por Malassezia, a
doença seborréica de pele e a foliculite bacteriana são fatores complicantes no
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